Pequena no tamanho, mas gigante em funcionalidade, a tireoide produz hormônios que regulam o metabolismo, a temperatura corporal e o desenvolvimento físico. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 750 milhões de pessoas no mundo vivem com algum distúrbio na tireoide, e mais da metade não sabem disso. No Dia Internacional da Tireoide, 25 de maio, a sociedade é convidada à reflexão sobre os cuidados com essa glândula tão importante. Especialistas da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) explicam os principais distúrbios que afetam a tireoide e alertam para a importância do diagnóstico precoce.
O que é a tireoide?
A tireoide é uma glândula com formato que lembra uma borboleta, localizada na parte da frente do pescoço, logo abaixo do pomo de Adão, popularmente conhecido como gogó, e produz dois hormônios: T3 (triiodotironina) e T4 (tiroxina). Eles regulam órgãos vitais, como cérebro, coração, fígado e rins. Além de exercer influência na memória, na concentração e no humor, contribuindo para o equilíbrio geral do organismo.
A endocrinologista Iane Gusmão, do Hospital Universitário Professor Edgard Santos, da Universidade Federal da Bahia (Hupes-UFBA), explica que os problemas na tireoide se dividem em dois grupos: “os que afetam a produção de hormônios e os que comprometem a estrutura da glândula. No primeiro grupo estão o hipertireoidismo, quando há excesso de hormônios circulando no organismo, e o hipotireoidismo, caracterizado pela produção insuficiente desses hormônios. Já no segundo grupo, estão alterações como nódulos tireoidianos, aumento do volume da glândula (bócio) e os tumores malignos, como o câncer de tireoide”.
Sintomas são silenciosos e podem ser confundidos
Os sintomas das doenças da tireoide são variados e, muitas vezes, confundidos com estresse ou cansaço. “No hipotireoidismo, os sintomas incluem sonolência excessiva, esquecimento, dificuldade de concentração, edema, sensação de frio, queda de cabelo, irregularidade menstrual, entre outros. Além disso, crianças com hipotireoidismo podem apresentar atraso no crescimento e dificuldade no rendimento escolar. Já no hipertireoidismo, os sintomas incluem irritabilidade, insônia, perda de peso, palpitações, tremores, sudorese excessiva, aumento da glândula tireoide, por vezes acompanhado de aumento do globo ocular”, detalhou Iane.
A avaliação da tireoide, como destacou a especialista, deve ser realizada na presença de sintomas de hipotireoidismo ou hipertireoidismo, bem como durante a investigação de anemia, colesterol elevado, infertilidade, abortos de repetição, depressão e na gestação. Pessoas com doenças autoimunes, como lúpus, diabetes mellitus tipo 1 e artrite reumatoide, devem realizar o rastreamento para disfunções da tireoide. Pacientes com síndrome de Down ou síndrome de Turner também apresentam maior risco e devem ser monitorados. Algumas medicações, como lítio e amiodarona, podem interferir no funcionamento da glândula, sendo necessário o acompanhamento dos níveis hormonais em quem faz uso dessas substâncias.
“Nódulos tireoidianos são frequentes, principalmente em mulheres após a menopausa, e podem ser detectados pela palpação do pescoço durante o autoexame ou em consulta médica. Apenas 5% dos nódulos são malignos. Nesses casos, o tratamento é cirúrgico, podendo ser necessária a retirada parcial ou total da glândula. O tratamento do hipotireoidismo é feito com a reposição oral diária do hormônio tireoidiano. Já o hipertireoidismo pode ser tratado com medicamentos; nos casos em que não há boa resposta, há a indicação de radioiodoterapia ou cirurgia”, afirmou a especialista.
Quando é necessário operar?
Conforme o cirurgião de cabeça e pescoço, José Gabriel Miranda da Paixão, do Hospital Universitário João de Barros Barreto (HUJBB), que integra o Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Pará (CHU-UFPA), a cirurgia da tireoide é indicada em situações especificas. Entre elas, quando há suspeita de câncer, nódulos maiores que três centímetros ou sintomas compressivos, como dificuldade para engolir ou respirar.
“A cirurgia é realizada com um pequeno corte de cerca de quatro centímetros no pescoço. A glândula pode ser retirada total ou parcialmente, dependendo do tamanho e da natureza do nódulo. Nódulos sólidos, os mais preocupantes, requerem maior atenção. Já os nódulos císticos ou mistos são geralmente menos graves, mas também podem exigir cirurgia se forem muito volumosos”, explicou o médico.
Ele informou que, após o procedimento, o paciente passa a ser acompanhado clinicamente por meio de ultrassonografias periódicas e exames laboratoriais, para avaliar a regulação do metabolismo. Além disso, muitos precisam fazer a reposição do hormônio tireoidiano. “Um pequeno número de pacientes também necessita de exercícios com fonoaudióloga, principalmente aqueles que usam a voz profissionalmente, como cantores e professores”, acrescentou Paixão.
Em junho de 2023, a agricultora Rejane do Socorro, 48 anos, moradora da vila Marauá, zona rural de Curaçá (PA), começou a sentir fortes dores de garganta e percebeu que algo não estava bem. “Comecei a sentir uma dor de garganta intensa. Depois, veio uma sensação de estar sempre engasgada. Tomava remédios para aliviar a dor, mas não resolvia o problema. Foi aí que procurei ajuda médica e descobri que estava com um nódulo na tireoide. O nódulo cresceu rapidamente e chegou a medir 12 por 9 centímetros, comprometendo minha alimentação e rotina”, contou.
Diante do agravamento dos sintomas, Rejane foi encaminhada ao HUJBB, em março de 2024, para a cirurgia para retirada da tireoide. O procedimento trouxe alívio físico, mas os efeitos emocionais persistiram. “Eu tinha vergonha de sair de casa, porque todo mundo ficava me olhando. Sentia-me desconfortável”. Além do desconforto social, ela enfrentou queda acentuada de cabelo, sonolência excessiva, perda de apetite e exaustão frequente. Hoje, após a cirurgia, Rejane segue em acompanhamento médico e celebra a melhora: “Minha qualidade de vida melhorou bastante. Agora consigo me alimentar bem e dormir direito”, disse.
Estrutura especializada na Rede Ebserh
Nos Hospitais Universitários Federais (HUFs) vinculados à Ebserh, pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) contam com apoio integral para o tratamento das disfunções da tireoide. No HUJBB, por exemplo, há um Ambulatório de Endocrinologia e de Cirurgia de Tireoide, especializado na avaliação de pacientes com nódulos. Um dos destaques é a punção guiada por ultrassonografia, exame que auxilia no diagnóstico e na definição da melhor conduta para cada caso. O Hospital também é referência no tratamento de pacientes com nódulos volumosos (bócio), que exigem abordagem cirúrgica combinada nas regiões cervical e torácica.
Entre maio de 2023 e abril de 2025, o HUJBB realizou 72 cirurgias de tireoide — sendo 36 tireoidectomias totais, 28 parciais e 8 paratireoidectomias. No mesmo período, foram registradas 1.972 consultas por hipotireoidismo, 928 por bócios não tóxicos (aumento da glândula sem alteração hormonal), 647 por tireotoxicose excesso de hormônios da tireoide), 304 por outros transtornos da tireoide e 226 por neoplasia maligna (câncer) da glândula.
Já no Hupes-UFBA, o Serviço de Endocrinologia conta com ambulatório específico para atendimento a pacientes com doenças da tireoide. A unidade é voltada prioritariamente para o acompanhamento de casos de câncer de tireoide e hipertireoidismo. A unidade realiza cerca de 160 atendimentos mensais por interconsulta, além de oferecer exames como ultrassonografia, punção aspirativa, cirurgias de cabeça e pescoço, e suporte de equipe de oftalmologia especializada na doença ocular da tireoide.
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